Vamos aproximarmos das primeiras falas de Zeno :
“Rever a minha infância? Já se vão mais de dez lustros, mas minha vista cansada talvez pudesse ver a luz que dela ainda dimana, não fosse a interposição de obstáculos de toda espécie, verdadeiras montanhas: todos esses anos e algumas horas de minha vida.
O doutor recomendou-me que não me obstinasse em pesrcrutar longe demais. Os fatos recentes são igualmente preciosos, sobretudo as imagens e os sonhos da noite anterior. Mas é preciso estabelecer uma certa ordem para poder começar de ab ovo. Mal deixei o consultório do médico, […] corri a comprar um compêndio de psicanálise e li-o no intuito de facilitar-me as tarefas.
Depois do almoço, comodamente esparrramado numa poltrona de braços, eis-me de lápis e papel na mão. […] Meu pensamento parece dissociado de mim. Chego a vê-lo. Eis que minha fronte se enruga ao pensar nas palavras que são compostas de tantas letras. […] Ontem tentei um abandono total. A experiência terminou no sono mais profundo e não obtive outro resultado senão um grande descanso e a curiosa sensação de haver visto alguma coisa importante durante o sono. Mas esqueci-me do que era, perdendo-a para sempre.” E a partir daí o personagem incursiona pela sua história. Zeno nos ajuda a pensar uma dimensão do fazer analítico e esclarecer, no meu entender, o mito da psicanálise ser quase que exclussivamente uma técnica que induz a uma análise histórica do paciente. Sucintamente a psicanálise é a a ciência que se ocupa dos distúrbios psíquicos originados no inconsciente, mais do que isso é um lugar de encontro onde o analista e o seu analisando podem colocar coisas novas em lugares vazíos ou inermes, sob a esteira da psicanalista francesa Elizabeth Roudinesco o fazer analítico implica numa espécie de remanejamento de lugares: em lugar da calmaria, as paixões, em lugar da ausência do desejo, os desejos , em lugar do fim da história, do nada, a História. Em todo processo terapêutico analíticamente orientado espera-se que obter este movimento no qual aparecem cenas do passado, do presente e devires. Cenas que têm um efeito no presente e por serem lembranças atualizadas precisam ser dinamizadas para que seja minimizada a intensidade do seu sofrimento psíquico e a sua ação depreciativa na vida do sujeito. Nesse sentido, a autobiografia de Zeno está a ocupar este lugar entretanto a fala do Doutor S. no prefácio nos instiga a curiosidade: Por que está a reinvdicar a divisão dos direitos autorais e o início do tratamento de Zeno?
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